Modalidade prevista na lei portuguesa, é tão pouco usada no momento actual que nem estatísticas existem a respeito, não tendo eu conseguido saber ao certo se, nos dias de hoje, existem seis, sessenta ou seiscentas crianças portuguesas a ser educadas nesse regime.
O ensino português, neste ano da graça de 2010, continua a ser e é massificador e compulsório, pelo menos até ao nono ano de escolaridade, altura em que o estado entenderá que a fornada, já moldada e convenientemente reduzida ao estatuto de robot ou pouco mais, poderá sair para a vida prática (da qual aprendeu muito mais na televisão do que na escola) ou prosseguir os seus estudos científicos no sentido de uma carreira universitária, da qual sairá uns oito anos mais tarde igualmente preparada e equalizada, em moldes, convenhamos, um tanto ou quanto mais envernizados. Ma non troppo.
Efectivamente, é comum contactarmos com (jovens) licenciados que não atingiram, no seu percurso universitário, alturas muito acima dos hábitos – patamares descobertos enquanto alunos, continuando a perseguir a lei do menor esforço, a aparência em vez da realidade, a cópia servil ao invés do raciocínio, a graxa em vez da verticalidade, o chico espertismo em vez da criatividade actuante.
Enquanto alunos, por exemplo, ter-lhes-á sido ensinado explícita ou implicitamente que deveriam ser participativos, e que a participação (numa aula) passa, ao que parece obrigatoriamente, por dedo no ar e asneira fora da boca, caso mais vulgar - dado que não houve tempo para se pensar na resposta adequada; continuam a fazer o mesmo nas reuniões de grupo, departamento ou etc., que por esta razão demoram cinco e seis horas na repetição interminável dos mesmos argumentos já mais que conhecidos como ineficientes ou mesmo falaciosos.
Enquanto alunos, ter-lhes-á sido transmitido que existem diversos métodos para obter “sucesso”, poucos dos quais passam por aplicação e trabalho árduo, e muitos passando por utilização de fraudes várias, chantagens emocionais, intimidação até, processos que já vi em movimento muitas vezes mais tarde, quando alguns desses ex-alunos se tornam finalmente professores.
Enquanto alunos, jamais lhes foi feito ver que as normas da boa educação surgiram para facilitar a vida em comum, mais ou menos pelos mesmos motivos pelos quais se enchem os cilindros de um motor com óleo lubrificante; algumas, poucas, foram-lhes impostas, é certo, coactivamente (coisa que me lembro de ter aprendido que as normas morais não podem ser) e a essas, submeteram-se enquanto obrigados; depressa foram esquecidas com o final da obrigação, e quanto às outras, a escola não as ensinou logo não as aprenderam, e como em casa também não (é muito vulgar, hoje, a crença de que a escola é que tem de ensinar) não as possuem. E daí o interromper-se quem está no uso da palavra com a maior cara de pau, o falar com a boca cheia, o mascar constante das pastilhas com o envio de perdigotos à cara do interlocutor, o entrar e o sair sem um bom dia, boa tarde ou boa noite e mais exemplos nem refiro.
Atrevo-me a dizer que se o estado pretende que as escola seja a única fonte de aprendizagem possível além da televisão e da net, claro (uma vez que propõe um ensino compulsório e exaustivo no tempo) então que leve essa tendência ao extremo, ensinando realmente tudo o que é preciso uma pessoa saber, nomeadamente que se deve dizer por vezes “obrigado” ou “obrigada”, e distinguindo já agora os casos de emprego do masculino e do feminino na simpática expressão.
Parece-me urgente que o estado português e mais as suas instituições ponderem maduramente na espécie de cidadão que está a ser formada, e que decida de uma vez por todas se é a esta malta tantas vezes inculta, papalva, grosseira, boçal, indiferente, quando não imoral e fraudulenta, que se pretende entregar os destinos do país, no presente e no futuro.
Alguns (em Portugal, não muitos) vêem o ensino doméstico como boa alternativa às escolas públicas. Admito que sejam pessoas treinadas a pensar pelas suas próprias cabeças, coisa que a escola pública parece não ensinar, nem ser feita para isso. Eu própria o frequentei, há uns bons cinquenta anos; escola pública, só na então chamada quarta classe, primeiro ano, quarto e quinto (agora denominados 5º, 8º e 9º anos) mais o secundário, o que perfaz no meu percurso pré-universitário, cinco anos de ensino doméstico versus seis de público, e durante muitos anos pareceu-me (humildemente o confesso) que postas na balança vantagens e inconvenientes, o ensino público teria mais das primeiras embora obviamente muitos dos últimos.
Desse modo pensando, quando chegou ao momento de matricular os meus próprios filhos fi-lo no ensino público. Tê-lo-ia feito hoje? Talvez não…
Quais serão, afinal, as reais vantagens do ensino público? Parece-me ver apenas uma, neste momento, que é o contacto diário com outras crianças e adultos detentores de uma formação diferente dos próprios pais e demais parentes; não posso deixar de pensar porém que tais contactos, à partida vantajosos por abrirem horizontes, não devem deixar de ser acompanhados, olho aberto, pelos pais, dado que na verdade os seus filhos, na escola pública, vão ter realmente contacto com toda a espécie de pessoas e de formações, o que poderá (se as leis da natureza ainda vigoram) conduzir ao mesmo do que a bem lembrada maçã podre entre as sãs. Deverão pois os pais atentos conversar amiúde com os seus filhos sobre os acontecimentos escolares, não entregando de olhos fechados o rebento às circunvalações do esquema.
Assim a escola pública parece contribuir favoravelmente para a socialização dos alunos que a frequentam, e para não muito mais, embora por vezes nem mesmo para isso contribua. Muitos alunos saem do percurso escolar, além de robotizados, humilhados, bullyizados e ofendidos por colegas, por professores, por funcionários…e quero crer com não muita vontade de investir, futuramente, em relações sociais.
A questão seguinte é se será a Escola pública o único local onde uma criança pode adquirir, ao menos, e na maior parte dos casos, uma boa socialização. Não deve ser decerto, pois se assim fosse nenhum dos meus quatro avós, por exemplo, mas acompanhados por muitos milhares ou milhões de seres humanos, jamais se teriam socializado, dado que nenhum deles conheceu nenhuma escola por dentro, nem pública nem particular. E no entanto, a acreditar em quem neles me falou, eram pessoas extremamente válidas e actuantes nos seus círculos sociais, dotados da suficiente auto-estima por um lado e praticando diligentemente a ajuda aos seus semelhantes por outro, em tudo modelos de cidadania e ombridade.
Não andaram na escola pública, e efectivamente nela não foi que aprenderam a ler nem a escrever nem a contar, ferramentas para a vida que ainda hoje se crêem essenciais, mas que nem sempre se aprendem convenientemente nas escolas oficiais – nem essas, nem outras.
Depois de todos estes considerandos, constato lamentavelmente que neste momento já não tenho filhos para matricular.
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